Em Outubro de 2009, rezava assim o Furia do Cajado:
Isaltino continua a amealhar votos (pelo menos), no concelho com a média mais elevada de licenciados do país. Para quando uma cadeira de ética nas escolas e universidades?
Como, quem não se sente, etc etc etc, o meu amigo e leitor deste pasquim, Vitor Birne, apresentou-nos as razões de contestação daquela nossa prosa.
Uns meses mais tarde, Isaltino de Morais volta a subir os degraus da justiça e desce com uma carga condenatória mais leve.
Mesmo assim, em cúmulo jurídico, pelos três crimes de fraude fiscal e um de branqueamento de capitais, o Tribunal da Relação de Lisboa condenou Isaltino Morais a uma pena de prisão de dois anos.
A opinião pública parece bem retratada num comentário de um leitor do Correio da Manhã, que começa assim: - Só uma velhinha é que roubou no Lidl (...)
Parece ser a opinião pública, mas em Oeiras, a tal opinião pública terá uma opinião diferente a avaliar pela popularidade (dado subjectivo) e pelos resultados eleitorais (dado objectivo).
Parece, repito parece, haver alguma semelhança com outras situações no país (Valentim, Felgueiras, Marco de Canaveses, Madeira, etc)
Este afigura-se ser um tema interessante de discussão e debate neste espaço.
Por essa razão, endereçámos um convite a Vitor Birne, profundo conhecedor da realidade de Oeiras, para elaborar um texto sobre a sua perspectiva do caso em apreço.
Aqui vai!
Vamos então falar um bocado mais a sério sobre o Isaltino e Oeiras.
Antes de mais algumas declarações de interesse:
· Respeito a vontade do eleitorado, mesmo que não seja coincidente com a minha;
· É para mim um princípio fundamental, inerente ao estado de direito, o que estabelece que até que um processo transite em julgado o réu é considerado, para todos os efeitos, como presumidamente inocente;
· Repudio a facilidade como um cidadão (e são vários os casos, englobando várias matérias) é “julgado” e “condenado” na praça pública;
· Condeno a utilização da Justiça com motivações ligadas à mais baixa política;
· Anseio por uma JUSTIÇA que: seja “justa”, seja “clara”, tome decisões em tempo, que esteja imune aos que dela se pretendam aproveitar, que puna os culpados, que ilibe os inocentes,… que reúna a confiança da sociedade, sendo claro para cada cidadão que é nela que encontra a justa e atempada decisão no que concerne ao contenciosos em que se vê envolvido;
· Repudio tudo o que está associado ao conceito de “que rouba, mas faz”.
Continuando…
Porque é que o Isaltino ganhou as eleições? Tenho pensado sobre esta questão! Ainda não cheguei a conclusões finais, mas já tenho algumas ideias, no essencial, ligadas a duas ordens de questões.
Por um lado:
· A situação de facto vivida no Conselho, sentida pelos munícipes e expressa numa vasta série de distinções que Oeiras vai recebendo ao longo dos tempos (a última tem 2 semanas e relaciona-se com o reconhecimento de que Oeiras é o melhor conselho para se estudar);
· O apoio do Isaltino entre os sectores com menores rendimentos, pelos apoios que vão recebendo da Câmara, entre os quais os relacionados com a habitação, mas não só. Estamos numa área em que se poderá falar de um certo populismo do Isaltino, mas que este sector “está com” o Isaltino não tenho grandes dúvidas, embora não possa avançar com uma expressão quantitativa desse apoio.
· O sentimento, que constatei pessoalmente (mais uma vez sem poder estabelecer a representatividade), de que o Isaltino estava a ser objecto de uma campanha, com origens que ninguém conseguia precisar, mas que conseguiu sobrepor-se à mensagem de “corrupto” passada (em termos bem agressivos) por todos os outros concorrentes e à sentença do Tribunal de Sintra proferida 2 meses antes das eleições.
Por outro lado e reportando aos resultados eleitorais que constam do ficheiro anexo:
· É interessante ver o movimento dos eleitores da eleição para a Assembleia da República, realizadas em 2005 e em 2009, para as autárquicas que se realizaram no mesmo ano:
o Em 2005, nas autárquicas (09OUT), o IOMAF, comparando com as legislativas (20FEV), vai buscar votos a todos os partidos. Sendo significativo o caso do PS que perde cerca de 26 mil eleitores (para o IOMAF e para a abstenção e apesar de eventualmente ter recebido alguns votos úteis de eleitores da CDU e do BE).
o Em 2009, nas autárquicas (11OUT), o IOMAF, comparando com as legislativas (28SET), também vai buscar votos a todos os partidos. Já é mais difícil inferir sobre as transferências de votos, mas regista-se que PS+CDU+BE perderam mais de 20 mil eleitores que, ou votaram IOMAF ou se abstiveram.
· Considero muito significativo que das legislativas para as autárquicas se verifique um incremento da abstenção. Em 2005 de 42126 (31,1%) para 60159 (43,7%), e em 2009 de 49977 (35,0%) para 66462 (46,0%).
· A título de curiosidade, incluo os resultados das presidenciais de 22JAN06 de onde se pode destacar a vitória do Cavaco, num conselho onde, nas legislativas de 2005 e 2009, foi o PS o partido mais votado.
Assim, na procura da resposta à questão “Porque é que o Isaltino ganhou as eleições”, direi que:
1. De facto a obra do Isaltino em Oeiras é visível;
2. Os partidos da oposição (que foram todos, quer em 2005, quer em 2009) não só não conseguiram segurar o seu eleitorado (que votou IOMAF ou se absteve), como também não conseguiram apresentar-se aos eleitores como capazes de conduzirem os destinos do Conselho, melhor do que o Isaltino.
Umas palavras para a Justiça, que tarda em fazer justiça e se presta à instrumentalização política/partidária, num processo que:
1. É despoletado em 2004, meses antes das eleições autárquicas de 2005. Pode ter sido coincidência mas deu jeito a quem estava contra Isaltino;
2. Arrasta-se durante todo o mandato 2005-2009;
3. Em AGO09 profere a sentença que se conhece, 2 meses antes das eleições. Mais uma coincidência? Mas deu jeito a alguns!
4. Em JUL10 a sentença da Relação (para os padrões actuais, não sei se foi muito ou pouco tempo? – lembro-me de ouvir dizer que a Relação estava a despachar em 3 meses – pelos vistos aqui o prazo foi mais dilatado) vem introduzir uma significativa alteração ao quadro em que Isaltino é condenado, dando alguma razão e, sobretudo, alento aos apoiantes de Isaltino, que assim reforçam a tese da cabala.
5. Isaltino vai recorrer! Para quando a decisão final do processo?
De facto uma Justiça assim não serve e dá azo às situações mais perversas.
Está na ordem do dia o estabelecimento da norma que proíbe a candidatura de cidadãos arguidos ou já condenados em 1ª instância (não sei bem em que pé é que está pois já ouvi as duas versões). E de uma outra norma que determina a perda de mandato em determinadas situações. Sobre estas duas normas tenho algumas dúvidas:
· Por um lado eu seria o primeiro a não concorrer ou a demitir-me no caso de se estarem a colocar dúvidas quanto à minha honorabilidade.
· Por outro lado, continuo a resistir aos “julgamentos” sumários feitos na praça pública e ao atropelo do princípio da presunção da inocência até que o processo transite em julgado.
Como as coisas estão, as pessoas estão extremamente receptivas a este tipo de normas, mas eu aqui deixo uma questão: no caso em que um cidadão se vê impedido de concorrer a um cargo político, ou é obrigado a demitir-se, por força de normas ainda a estabelecer; o que é que acontecerá no caso de se vir a provar a sua completa inocência?
Assim, no meu entendimento e como já o disse, a “culpa” do Isaltino ter sido reeleito (com mais 6000 votos do que em 2005) não deve ser atribuída aos “licenciados de Oeiras com falta de aulas de ética”, mas sim:
· A uma Justiça que tarda em fazer justiça e se presta a ser utilizada por interesses políticos/partidários;
· A uma oposição que não só não consegue “segurar” os seus eleitores (nas legislativas) como, sobretudo, também não consegue apresentar-se como alternativa para a condução dos destinos do Conselho.
Caros leitores, está lançado o convite de debate.
Opinem a vosso belo prazer!